Política

"Da água pro vinho": Prefeitura muda de lado após acordo bilionário com a Braskem

Em 2022, Município defendia realocação de moradores de comunidade isolada, mas entrou com ação para indeferir pedido da DPE

Por Redação 30/10/2023 17h05 - Atualizado em 30/10/2023 19h07
'Da água pro vinho': Prefeitura muda de lado após acordo bilionário com a Braskem
Comunidade do Flexal vive situação de ilhamento, após crime ambiental da Braskem - Foto: Assessoria

A Prefeitura de Maceió entrou com uma ação para que seja mantido o indeferimento do pedido da Defensoria Pública do Estado (DPE) sobre a necessidade de realocação das milhares de pessoas que moram nos Flexais de Baixo e de Cima, no bairro do Bebedouro, em Maceió. De acordo com o coordenador do Núcleo de Proteção Coletiva da Defensoria Pública de Alagoas, Ricardo Melro, a prefeitura passou a defender a manutenção da comunidade isolada após acordo bilionário com a Braskem.

A região dos Flexais está isolada após o crime ambiental provocado pela Braskem e que retirou dos bairros do Bebedouro, Pinheiro, Mutange, Bom Parto e Farol cerca de 60 mil pessoas, uma vez que o único acesso aos Flexais se dá pelo bairro do Bebedouro.

O município de Maceió pede a impugnação da manifestação da Defensoria Pública do Estado (DPE) que considera a realocação a única alternativa para o problema de ilhamento social e assevera que a retirada da população da região não levaria à mutilação da cidade. Para isso, o Município questiona a legitimidade do parecer técnico no qual se sustenta a manifestação da DPE.

A ação da Prefeitura chama de "esperneio da DPE" o acordo entre a Braskem e a Prefeitura que garantiu 25 mil reais de indenização por núcleo familiar para os moradores do bairro em situação de isolamento. O documento questiona que o "Parecer" foi expedido por um único professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e aponta supostos "equívocos técnicos".

Ricardo Melro, em entrevista ao Jornal de Alagoas, questiona a mudança de posicionamento da prefeitura de Maceió após o acordo com a Braskem para o recebimento de R$ 1,7 bilhão. "A prefeitura mudou da água para o vinho e passou a defender o que a Braskem queria".

"Eles [Prefeitura] querem que o povo permaneça lá contra sua vontade, no valor que eles acertaram com a Braskem, que acertou para pagar R$ 25 mil com quitação total. É uma monstruosidade, principalmente para uma prefeitura que tinha uma posição totalmente diferente antes de receber o R$ 1,7 bilhão da Braskem. A prefeitura antes de receber aquele dinheiro ela era a favor da realocação", afirma Melro.

Ele classificou como vergonhoso o acordo feito entre a empresa e o ente municipal para o pagamento de R$ 25 mil por núcleo familiar da comunidade dos Flexais. Ricardo afirmou também que no pedido de indeferimento da ação, o município não apresentou nenhuma prova técnica que corrobore suas alegações e que o parecer representa a Ufal, com provas de que o documento é legítimo.

Em 2022, a Prefeitura de Maceió se manifestava a favor da realocação. Em ofício assinado pelo à época coodenador geral do Gabinete de Gestão Integrada (GGI) dos bairros, Ronnier Reynner Teixera Mota, enviado à Braskem com cópia para o MPF, MPE, DPU e DPE, o município diz que "se os moradores da região, em sua maioria, entenderem que o projeto de Requalificação é a melhor solução, não haverá, por parte da Prefeitura de Maceió qualquer oposição".

Texto publicado pela Secretaria de Comunicação de Maceió no próprio site da prefeitura, datado de fevereiro de 2022, tem o título: "Prefeitura ouve demandas da população dos Flexais e reforça apoio por realocação" e aborda um encontro entre autoridades e a população do bairro.

No material, as falas do coordenador do GGI apontam a necessidade de realocação: “Recebemos um pedido da Defensoria Pública para realizarmos mais esta rodada de conversa, tendo em vista o fato do ilhamento socioeconômico da região dos Flexais. Pudemos conversar e extrair o máximo do que este povo deseja para o seu ambiente. A nossa intenção é transformar estes anseios em políticas públicas ou proposta de realocação e readequação da comunidade”, disse, à época Ronnier.

O Jornal de Alagoas questionou o município sobre o que levou a mudança drástica de posição em relação a essa situação. De acordo com a Prefeitura ainda há a possibilidade de realocação, caso os objetivos de 23 medidas socioeconômicas que estão sendo implantadas não sejam alcançados.

Leia a nota completa:

A Prefeitura de Maceió apontou, desde maio de 2021, em relatório entregue aos órgãos de controle que são parte do processo de compensação junto à Braskem, que as áreas dos Flexais sofrem com o ilhamento socioeconômico e, a partir disto, foi assinado pelo Município de Maceió, Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público Estadual (MPE), Defensoria Pública da União (DPU) e Braskem o Termo de Acordo para implementação de 23 medidas socioeconômicas.

A requalificação visa promover o acesso da comunidade a equipamentos e serviços públicos, além de fomentar o comércio local. O acordo prevê ainda, após as implantações de todas as melhorias dentro do prazo estabelecido, a possibilidade de realocação, caso, ainda, os objetivos não sejam alcançados.