Municípios

Comunidades próximas à mineradora em Craíbas denunciam atividade de extração durante a madrugada

Segundo a população, explosões, passagem de grandes carros e tremores ainda são perceptíveis; paredes de algumas casas continuam rachadas e com risco de desabamento

Por Jamerson Soares 23/08/2025 11h11 - Atualizado em 23/08/2025 13h01
Comunidades próximas à mineradora em Craíbas denunciam atividade de extração durante a madrugada
Comunidades ficam localizadas próximo à Mineração Vale Verde, na zona rural de Craíbas - Foto: Assessoria

Moradores de comunidades que ficam próximas à mineradora Mineração Vale Verde (MVV), na zona rural de Craíbas, município do Agreste de Alagoas, têm passado por um momento de desassossego devido aos barulhos e tremores que ainda são perceptíveis na região.

Ao Jornal de Alagoas, uma das lideranças dessas comunidades, Tancredo Barbosa, reclamou das atividades que a mineradora realiza para a extração de cobre no Sítio Lagoa do Mel. Tancredo gravou a movimentação da mineradora por meio de um vídeo, na madrugada da última quarta-feira (20).

Nas imagens, é possível ver apenas escuridão, algumas luzes ao fundo, sons de máquinas escavando e de movimentos de pessoas trabalhando. Há também a seguinte frase: "Mineradora em Craíbas, 2h35 da manhã, barulho de máquinas 24h. A pergunta: a população precisa ser respeitada?"

Ele contou que o barulho das máquinas tem sido intenso todos os dias, durante 24h, toda a madrugada, e que alguns moradores não estão conseguindo dormir, pois estão apreensivos com o que pode acontecer a qualquer momento com as casas. Além disso, segundo os moradores, há explosões na mina e uma grande movimentação de carros e caminhões sobre as vias que ficam perto das residências.

"É uma complicação de números tamanhos pois os veículos da mineradora também passam 24 horas para cima e para baixo. É um volume de carro muito grande na região. Na nossa rodovia, o barulho é 24 horas", afirmou Tancredo.

Para ele, a vinda da mineradora transformou radicalmente o modo de vida dos moradores, que era considerado pacato e simples.

"Eu particularmente moro a 200 metros da área de exploração da mineradora, então imagine ter semanalmente duas, três vezes na semana, explosões dessa magnitude perto daqui. A pessoa perde aos poucos a sua casa. A casa realmente treme, o chão treme, as paredes tremem, o telhado treme. É um terremoto toda semana", relatou.

Mais de 400 casas estão com paredes rachadas e algumas com risco de desabar.

Por meio de nota, a MVV informou que ficou ciente das reivindicações dos moradores e está mobilizada para averiguar e tratar os eventos de ruído que foram citados (veja a nota completa ao final da matéria).

Promessa de mudanças

A mineradora Vale Verde chegou na zona rural de Craíbas entre 2020 e 2021, com a promessa de que a atividade de extração na mina possibilitaria um avanço para o município, que iria gerar empregos e muita renda para a população.

Passaram-se os dias e alguns moradores tiveram que ser retirados da região por causa da instalação efetiva da mineradora, como também para "preservar" a saúde das pessoas da comunidade. 

A mina fica a céu aberto e todo esse processo de extração, segundo a comunidade, lança partículas e poeira no ar, além de provocar ruído no momento de detonação de explosivos, afetando as pessoas, a flora e a fauna da região.

Para a extração do cobre, a Vale Verde utiliza uma atividade com detonação de explosivos e desmonte da rocha. Os trabalhadores perfuram as bancadas para o carregamento dos explosivos, sendo necessário para sua detonação um iniciador no interior da massa explosiva.

Ação civil pública


Em 2022, os primeiros relatos de problemas de rachaduras nas casas e tremores começaram a aparecer nas comunidades. Em fevereiro desse ano, a Defensoria Pública da União (DPU) recebeu denúncias dos moradores sobre o ocorrido e uma reunião virtual foi realizada entre eles para tentar resolver a situação.

Um ano depois, a DPU acionou a Justiça Federal para cobrar que os órgãos públicos realizem estudos técnicos para verificar o impacto da extração de cobre realizada pela empresa e fiscalizar a atividade.

Na ação civil pública, o defensor regional de direitos humanos de Alagoas, Diego Alves, explicou à época que moradores do entorno convivem, desde 2021, com rachaduras em suas casas e muita poeira no ar, o que causou ou piorou problemas de saúde, principalmente em idosos e pessoas com deficiência.

Segundo o defensor, o período coincidiu com o início das explosões para extração de cobre realizada pela mineradora. Na ação da DPU, há a constatação de que todos os laudos atestando a segurança da atividade para os moradores foram produzidos por empresas contratadas pela própria mineradora.

A Justiça, então, determinou a instalação de equipamentos para saber as causas e medir a intensidade dos tremores. O objetivo era que fossem investigados os impactos da mineração na qualidade de vida e nas residências de moradores da região.

A mineradora foi favorável aos estudos para entender as causas da rachadura, porém recorreu da determinação de instalar os sensores, pois considerava alto o valor cobrado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte para desenvolver o projeto.

A reportagem do Jornal de Alagoas entrou em contato com a assessoria da Justiça Federal, para saber se há alguma novidade sobre o assunto e se o órgão resolveu a situação, mas não obteve resposta.

Questionamentos também foram feitos à Prefeitura de Craíbas sobre a permissão da entrada da mineradora na cidade, a motivação e se o município está acompanhando o ocorrido, porém a reportagem não teve retorno.

Mineradora vendida


Em abril de 2025, a Vale Verde foi vendida integralmente para o grupo chinês Baiyin Nonferrous Group Co., Ltd, por US$ 420 milhões. O anúncio foi publicado pela Appian Capital Advisory LLP, gestora britânica que administrava a mineradora.

A transição foi realizada sem consideração de caixa e dívida, garantindo o repasse de 100% do capital da MVV.

A China é o principal destino da MVV de exportações, com 18 carregamentos de minério de cobre enviados ao país asiático desde o início das operações.

Desde o começo das atividades na Mina Serrote, em Craíbas, já foram enviadas 300 mil toneladas secas (DMT) do produto, distribuídas em 29 embarques. Além da China, Finlândia é o segundo maior comprador do minério alagoano, com nove carregamentos feitos pelo Porto de Maceió. O material também foi exportado para a Índia e a Polônia.

NOTA DA MVV

A Mineração Vale Verde (MVV), através de seu contínuo contato com os moradores das comunidades em seu entorno, tomou ciência dessas reivindicações e está mobilizada para averiguar e tratar os eventos de ruído que foram citados, na zona rural de Craíbas, nas proximidades do empreendimento.

A MVV reforça que todos os resultados de seus monitoramentos ambientais (incluindo ruído e pressão acústica) estão dentro dos parâmetros estabelecidos pela lei vigente. Vale ressaltar que os dados gerados são devidamente submetidos e avaliados pelos órgãos competentes.

Todos os meses, dentro da mineradora, acontece o encontro do Comitê Social Participativo de Mineração (CSPM), com representantes do poder público e das comunidades da Área de Influência Direta (AID) da MVV, a fim de ouvir os anseios e dialogar para a tomada de decisões que beneficiem as partes interessadas.

Adicionalmente, a empresa informa que realizará, a partir deste mês de agosto, visitas dentro da Mina Serrote com o “Programa Portas Abertas” com as comunidades, para que moradores da região conheçam de perto os processos dentro da MVV, com foco no fortalecimento da transparência, relacionamento e diálogo franco com as comunidades da AID.