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Pesquisadores de Pernambuco atestam eficácia de curativo pós-cirúrgico feito à base de cana-de-açúcar

Material é feito a partir da fermentação do melaço da cana, através do insumo desenvolvido pelos pesquisadores

Por Redação com Folha PE 20/09/2025 09h09 - Atualizado em 20/09/2025 09h09
Pesquisadores de Pernambuco atestam eficácia de curativo pós-cirúrgico feito à base de cana-de-açúcar
Curativo feito à base da cana-de-açúcar tem mostrado eficácia no tratamento pós-cirúrgico de varizes - Foto: Reprodução/Internet

Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) mostrou que é possível utilizar a cana-de-açúcar para a criação de um curativo biológico sustentável, tendo bons resultados no tratamento de feridas pós-operatórias em pacientes que passaram por cirurgias de varizes nas pernas.

O curativo é feito a partir da fermentação do melaço da cana-de-açúcar, através do insumo desenvolvido pelos pesquisadores. O insumo é um biopolímero verde, biocompaível e biodegradável. A membrana é produzida pela conversão do melaço feita por bactérias em celulose bacteriana.

O trabalho foi publicado na revista científica Journal of Vascular Surgery: Venous and Lymphatic Disorders (JVS-DL). O estudo clínico randomizado foi feito com 55 pacientes da Área Assistencial de Angiologia e Cirurgia Vascular do Hospital das Clínicas (HC).

Sob a orientação do chefe da Área Assistencial de Cirurgia Vascular do HC e professor do Centro de Ciências Médicas da UFPE, Esdras Marques, o estudo foi realizado entre maio de 2023 e setembro de 2024 por Allan Maia e participação da então aluna da graduação em Medicina da UFPE, Mariana Vieira.

O artigo foi assinado também por Fernanda Rocha, Layla Mahnke, Flávia Morone Pinto, Tiago Pereira, Mariana Neves, Sarah Palácio, Katharine Saraiva, Josiane Barbosa, Simone Penello, Jaiurte Silva e José Lamartine Aguiar.

Curativo feito à base de cana-de-açúcar (à esq.) mostrou-se eficaz no comparativo com o material sintético (à dir.) | Foto: Hospital das Clínicas da UFPE/Divulgação

Teste

Segundo um dos autores do estudo, o cirurgião vascular do HC e doutor pelo Programa de Pós-graduação de Cirurgia da UFPE, Allan Maia, o curativo é um produto natural, sustentável e com potencial de ser barato e fácil para produção em larga escala.

Para testar a eficácia, os pacientes foram divididos em dois grupos: 1 - No grupo experimental, foi usado um curativo feito de cana; 2 - no grupo de controle, foi utilizado fita microporosa (sintético).

Entre o quarto e o sexto dia pós-operatório, os pesquisadores avaliaram dor, coceira e aspecto da ferida. Não houve diferença significativa entre os dois tipos de curativo em termos de cicatrização, mas o feito à base de cana gerou menos dor do que foi a fita convencional na hora da retirada e também menos coceira.

"O principal achado no estudo foi que ele apresentou menor dor na remoção dos curativos. Dessa forma, reduzimos significativamente mais um fator de incômodo para o paciente que já se encontra fragilizado pelo pós-operatório", destaca Allan Maia.

Benefício

O material é transparente e permite que os profissionais avaliem a ferida sem precisar removê-lo. O benefício também é encontrado em estudos do material para outros fins, como na urologia e em tratamento de úlceras nas pernas. Isso reduz o manuseio, evita traumas na pele e ainda pode baratear os custos do tratamento.

"Como na cirurgia de varizes se preconiza manter os curativos de dois a sete dias, a depender da literatura, o aspecto da incisão pode ser visto por transparência. Ou seja, você não precisa remover o curativo pra saber se vai tudo bem com cirurgia. Sem dúvidas, essa é uma grande vantagem em relação à fita microporosa", completa o cirurgião vascular. 

Allan ainda explica por que o insumo foi testado especificamente no pós-operatório de varizes. Segundo ele, a literatura médica não indica um curativo ideal para as incisões que são feitas no procedimento.

"Nós removemos os vasos dilatados através de pequenas incisões que não necessitam ser fechadas por pontos. Porém precisamos cobrir essas feridas com curativos que apresentem boa aderência e que não causem reações locais. A fita microporosa é utilizada amplamente, mas há alguns relatos de incômodo na remoção, coceira e dermatite. A membrana de biopolímero já foi testada em diversas áreas da medicina como curativo e, por ser atóxico, translúcido e apresentar boa adesividade, achamos que poderia ser o material ideal para cobertura dessas incisões", explica Maia.

Agora, os pesquisadores aguardam a liberação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para o produto ser comercializado.

O produto foi registrado como PolyTissue® Derma-Aid e é produzido pela Polisa Biopolímeros para a Saúde, uma empresa incubada pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) em Carpina, em Pernambuco.