Agro
Produção de etanol de milho dispara e deve superar 25% do total em 2025, diz Unem
Investimentos previstos somam R$ 40 bilhões e incluem a instalação de 16 novas usinas

A produção do etanol de cana-de-açúcar caiu na safra que terminou em março, mas o milho garantiu um novo recorde no total, com 34,96 bilhões de litros. Segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica), o etanol de milho saltou 30,7% em 2024/25, para 8,19 bilhões de litros.
Assim, em dez anos, a produção se multiplicou por dez. Para os próximos anos, estão mapeados R$ 40 bilhões em investimentos, conforme a União Nacional do Etanol de Milho (Unem), que reúne os fabricantes.
Em 2025, o milho deverá chegar a 10 bilhões de litros no Brasil, mais de um quarto do total nacional, estima a Unem, no ano em que o Programa Nacional do Álcool (Proálcool) completará 50 anos.
Segundo executivos e especialistas, o avanço acelerado do etanol de milho é impulsionado por um modelo de negócios que parece imbatível. A grande oferta do grão a preço competitivo passa por uma tecnologia industrial bem estabelecida, de origem americana – nos EUA, maior produtor de etanol do mundo, o milho é a matéria-prima principal.
Além disso, a entrega inclui também o DDG (grãos secos de destilaria, na sigla em inglês), usado como ração animal. O produto tem potencial de ser exportado, inclusive para a China, que acaba de abrir o mercado para o Brasil.
“Safrinha” só no nome
O pontapé inicial foi o crescimento da disponibilidade do milho. Na safra 2000/01, a produção nacional foi de 42,3 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), estatal do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Pouco mais de dez anos depois, a safra total do grão havia dobrado.
O aumento é fruto do sucesso do modelo brasileiro de cultivo da soja, com o plantio direto e uma segunda safra de outra cultura para ajudar a preparar o solo. O Brasil se tornou o maior produtor e exportador de soja do mundo, e o milho veio junto. A “safrinha” manteve o diminutivo só no nome, e o país passou a disputar com os EUA o posto de maior fornecedor global de milho.
A FS, pioneira na produção a partir do milho no Brasil, traz uma integração entre os dois países. “O nosso acionista, a Summit, já tinha investido na maior empresa privada de etanol de milho nos EUA, que era a Hawkeye Renewables, que foi vendida. Aí, a Summit foi buscar um novo lugar para investir em etanol de milho. E o Brasil foi o destino natural. Mato Grosso tem o milho mais barato do mundo”, diz o vice-presidente de Sustentabilidade e Novos Negócios da FS, Daniel Lopes.
Além da maior oferta, escoar a crescente produção requer investimentos em armazenagem e logística. Por isso, faz sentido investir para beneficiar e agregar valor.
O modelo atraiu diferentes tipos de investidores, como fabricantes de açúcar e álcool que apostam na diversificação, produtores de grãos que formam sociedades, comercializadores de grãos e uma nascente indústria dedicada apenas ao etanol de milho, como no caso da FS, controlada pela americana Summit AG em sociedade com a Tapajós Participações, que reúne grandes produtores de grãos de Mato Grosso.
16 usinas previstas
Os primeiros litros saíram, na safra 2011/12, de uma usina “flex”, que produz etanol tanto da cana quanto do milho, da Usimat, empresa instalada em Mato Grosso. Entre os fabricantes de açúcar e etanol, apostaram no milho a SJC Bioenergia, em 2015, a CerradinhoBio, em 2019, e a São Martinho, em 2023.
Comercializadora e varejista, a gaúcha 3Tentos, que já tem usinas de processamento de soja e refinarias de biodiesel, está investindo R$ 1,2 bilhão para inaugurar uma biorrefinaria de etanol de milho, em Porto Alegre do Norte (MT), em 2026.
Para investir, a companhia tomou empréstimo de R$ 500 milhões com o BNDES. Os projetos de biocombustíveis estão aptos a receber recursos do Fundo Clima, que têm juros mais baixos. Com isso, aprovou R$ 4,3 bilhões em financiamentos para investimentos em biocombustíveis em 2024. E espera repetir a dose este ano, segundo José Luís Gordon, diretor do BNDES.
A FS inaugurou sua primeira fábrica, com tecnologia americana, em 2017 em Lucas do Rio Verde (MT). Hoje, são três unidades, incluindo Sorriso (MT) e Primavera do Leste (MT). A produção anual atingiu 2,4 bilhões de litros de etanol no primeiro trimestre, com receita de R$ 10,7 bilhões no acumulado em 12 meses.
A Inpasa também apostou na tecnologia americana, mas as operações começaram no Paraguai, em 2006. No Brasil, a empresa estreou em 2019, na biorrefinaria de Sinop (MT); segundo a empresa, trata-se do maior complexo de etanol de grãos da América Latina. A Inpasa tem capacidade de produzir 5,8 bilhões de litros por ano.
No total, são 25 biorrefinarias de etanol de milho no país. Além disso, mais 16 unidades têm autorização de construção, conforme a Unem, que mapeou ainda outros 16 projetos em planejamento.
Os R$ 40 bilhões em investimentos projetados incluem R$ 15 bilhões em parte dos 16 projetos autorizados, para ampliar a capacidade em 5 bilhões de litros por ano, e R$ 25 bilhões em armazenagem e logística, estima o presidente da entidade, Guilherme Nolasco.
Após o crescimento, Nolasco vê alguma acomodação nos investimentos. A FS está mais focada em reduzir o endividamento. O principal investimento, de R$ 550 milhões, é em um projeto de captura de carbono, para tornar a produção do etanol ainda mais sustentável, o que poderá permitir cobrar prêmios no preço de exportação para a Europa, explica Lopes.
“Tirar o boi do pasto”
Já a Inpasa, após investir R$ 4,9 bilhões no ano passado, projeta aportar mais R$ 4 bilhões este ano, segundo o vice-presidente de gestão e finanças Fernando Alfini. Os recursos vão para as ampliações nas biorrefinarias de Balsas (MA) e Sidrolândia (MT) e para a construção da unidade de Luís Eduardo Magalhães (BA), que deverá ficar pronta em 2026. Assim, terá 1,6 bilhão de litros de etanol por ano a mais.
“Sempre olhamos o mercado. Hoje, um dos impactos quando vamos rodar planos de negócios é a questão tributária; esse é um ponto que pode dar uma freada nos nossos investimentos, porque isso gera um pouquinho de indefinição, de insegurança”, diz Alfini.
Ele defende que o etanol de milho emite menos carbono e não concorre com a produção de alimentos. A segunda safra não tira espaço da soja, e o DDG, que seria uma sobra, retorna para a cadeia alimentar como ração.
“Cerca de 85% da nossa carne ainda é produzida no pasto. Os EUA cresceram no etanol de milho à base de dar DDG para o gado. Hoje, 100% da carne americana produzida é em estábulos. O Brasil vai para o mesmo caminho. Vamos conseguir, com o etanol de milho, tirar o boi do pasto” diz o professor Luis Augusto Barbosa Cortez, da Unicamp. Ele lembra que a pecuária mais intensiva reduzirá as emissões do país e liberará terras degradadas para agricultura.
Para a produção de açúcar, a ascensão do etanol de milho será complementar. Um efeito é acabar com a irregularidade da oferta nos períodos da entressafra de cana. Outro é espalhar o etanol pelo país.
“O milho está indo para regiões onde a cana não teria espaço ou aptidão. Torna a oferta de etanol mais robusta e menos suscetível a questões climáticas”, afirma o diretor de inteligência setorial da Unica, Luciano Rodrigues.
