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Como o conflito entre Israel e Irã afeta o agronegócio do Brasil

Escalada militar no Oriente Médio pode elevar os custos de insumos agrícolas, além de gerar incerteza sobre exportações para países islâmicos

Por Nova Cana 14/06/2025 10h10
Como o conflito entre Israel e Irã afeta o agronegócio do Brasil
Imagem ilustrativa - Foto: Reprodução

O ataque de Israel ao Irã causou forte repercussão nos mercados internacionais, deixando o agronegócio brasileiro em alerta. Como reação imediata ao bombardeio de alvos iranianos – incluindo a usina nuclear de Natanz, a maior do Irã, e bases aéreas – o preço do petróleo disparou, registrando alta superior a 7% logo no início do dia.

Esse movimento de valorização se refletiu também nas cotações de commodities agrícolas. Na manhã desta sexta-feira, 13, óleo de soja, trigo e óleo de palma subiram mais de 2% nas bolsas internacionais. Produtos como suco de laranja, aveia, borracha e óleo de canola também apresentaram ganhos superiores a 1%.

Em entrevista ao Agro Estadão, o professor João Alfredo Nyegray, especialista em negócios internacionais e geopolítica da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), explicou que o conflito entre Israel e Irã representa um risco real para as cadeias globais de suprimentos, especialmente no que diz respeito à segurança alimentar e à logística internacional.

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Contudo, há um impacto direto sobre o agronegócio brasileiro. “O agro é um dos motores da economia nacional e, justamente por isso, está muito exposto a choques como esse. O alerta principal é duplo: risco para o fornecimento de insumos e dificuldade de entrega de produtos, como milho e carnes halal, a mercados estratégicos como o Oriente Médio”, sinaliza Nyegray.

No aspecto de importação, o alerta está na compra de insumos. Isso ocorre porque o Brasil importa cerca de 80% dos fertilizantes utilizados nas produções agropecuárias e boa parte desse volume vem de países direta ou indiretamente afetados pela tensão no Golfo Pérsico. Além disso, o Irã desponta como um importante fornecedor de ureia e de derivados petroquímicos fundamentais para a indústria de fertilizantes.

Segundo Nyegray, se houver uma retaliação iraniana – como o bloqueio do Estreito de Ormuz, que conecta o Golfo Pérsico com o Golfo de Omã e por onde passa cerca de 20% do comércio global de petróleo – ou sanções internacionais contra Teerã, o fornecimento desses insumos pode ser comprometido. “Com a redução da oferta e o encarecimento do frete, o preço do fertilizante pode subir rapidamente. E isso pressiona os custos de produção no Brasil”, alerta o professor.

Esse risco se soma a um cenário já sensível para os produtores brasileiros que ainda não fecharam a compra de seu pacote de insumos para a safra 2025/26. Conforme noticiado pelo Agro Estadão, o ritmo de vendas este ano está lento, assim como no ano passado.

Exportações ameaçadas

No outro extremo da cadeia, o escoamento de produtos brasileiros para países islâmicos também está em xeque. O Oriente Médio e o Norte da África são mercados estratégicos para as proteínas animais do Brasil.

Segundo dados da Associação Brasileira de Proteína Animal, no ano passado, 30,59% da carne de frango exportada pelo Brasil teve como destino países do Oriente Médio, enquanto a África representou 18,70% do mercado. Além disso, o Irã figura entre os 20 principais compradores de milho brasileiro.

Assim, uma escalada do conflito ou ações grupo extremistas aliadas ao regime iraniano – como Hezbollah (Líbano), Hamas (Palestina) ou forças no Iraque e Iêmen – podem desestabilizar politicamente a região. Isso desencadearia um retrocesso da demanda, dificuldades logísticas e até boicotes por motivos religiosos ou geopolíticos.

“É um xadrez complexo. Se o Irã ou seus aliados dificultarem o tráfego marítimo ou atacarem navios mercantes, haverá restrições logísticas severas. Por isso, o frete marítimo já está subindo rapidamente hoje”, salienta Nyegray.

Pressão inflacionária

O aumento do preço do petróleo afeta diretamente o custo do diesel no Brasil, encarecendo o transporte interno de grãos e alimentos. A dependência do modal rodoviário agrava o problema.

“Isso impacta o escoamento da produção agrícola de estados como Mato Grosso, Goiás e Paraná até os portos de Santos e Paranaguá. Também eleva o custo da distribuição de alimentos dentro do país, gerando efeitos inflacionários”, diz o professor.

Ele explica ainda que há alternativas logísticas para contornar o Canal de Suez ou o Estreito de Ormuz, como a rota pelo Cabo da Boa Esperança, na África, mas isso representa acréscimo significativo no tempo e no custo do transporte marítimo.

Além disso, a volatilidade cambial tende a se intensificar, o que já foi verificado na manhã desta sexta: o dólar que, na semana atingiu o menor patamar de fechamento deste ano (R$ 5,53), voltou a subir, encostando em R$ 5,60.

“Com isso, há uma fuga de capitais de países emergentes, valorização do dólar. E, embora essa desvalorização do real beneficie os exportadores agrícolas, ela também tende a aumentar o custo dos itens importados, somado a questão do frete”, afirmou.

“Então, assim, seria o que alguns analistas da área chamam de lógica híbrida, na qual o ganho da exportação dolarizada tem que ser equilibrado com custos crescentes de importações que também são dolarizadas e industrializadas”, complementou.

Outro efeito colateral do conflito é o risco de desabastecimento e inflação nos mercados importadores de alimentos brasileiros. Países como Egito, Indonésia, Arábia Saudita e o próprio Irã são grandes compradores de trigo, milho, frango e açúcar do Brasil. Se as rotas comerciais forem afetadas, esses países podem enfrentar crises alimentares internas, elevando ainda mais a tensão geopolítica.