Atravessar um mar de cadeiras e esperar o tempo passar. Até o momento do embarque, os desafios da diarista Maria dos Navegantes, de 51 anos, moradora de Valparaíso de Goiás (GO), eram segurar a ansiedade e organizar as duas caixas e três malas para a viagem.

Com um nome de batismo que reflete seus desafios diários frente à solidão e ao orçamento apertado, Maria chegou cedo à rodoviária de Brasília (DF), pronta para encarar mais de 700 quilômetros de estrada até Frutal (MG). O objetivo: passar o Natal ao lado da filha, Gabriela, de 26 anos, e das netas, Eloá, de 5, e Isabela, de 3.

As passagens de ida e volta superam R$ 1 mil, tornando inviável viajar outras vezes durante o ano. Mas Maria encontrou uma forma de transformar a saudade em pacotes que cabem no bagageiro do ônibus.

“Nas minhas caixas, o que mais tem são presentes que eu fui comprando para elas ao longo deste ano em que não nos vimos. Não vejo a hora de abraçá-las. É o meu presente de Natal”, contou a diarista, enquanto calculava o tempo para reencontrar as meninas.

O cuidado com o Natal, que transforma terminais rodoviários em verdadeiros mares de gente, vai além do aspecto religioso. Segundo levantamento do Instituto Locomotiva, essa é a principal data de encontro familiar no Brasil: 61% dos brasileiros afirmam estar sempre com a família na ocasião, enquanto outros 32% dizem que isso acontece às vezes.

As mulheres demonstram atenção ainda maior a esses encontros. Segundo a pesquisa, elas participam mais frequentemente de reuniões familiares mensais: 65% delas, contra 58% dos homens.

A pesquisa, que ouviu mais de 4 mil brasileiros maiores de 18 anos, revelou ainda que 68% valorizam rituais familiares e datas comemorativas. Para 75%, a felicidade só é completa quando compartilhada com quem se ama.

Esses rituais são tão importantes que motivaram a família da pedagoga brasiliense Laíssa Macedo, de 26 anos, a antecipar a festa de Natal para o dia 21 de dezembro. O motivo: Laíssa escolheu viver uma experiência diferente em 2025.

Ela decidiu participar de uma ação missionária social em Conceição da Paraíba, a quase 2 mil quilômetros de casa, onde entregará materiais escolares e de higiene a comunidades em situação de vulnerabilidade.

“Será um Natal diferente para mim. Minha família sentiu, mas entendeu que só vou voltar no final de janeiro”, relatou Laíssa.

Rosiane Martins, cuidadora de idosos de 23 anos e colega de Laíssa, também se despediu dos seis irmãos. “Estamos pensando que podemos ter uma ceia diferente e relação de família também com quem não conhecemos”, comentou.

A pesquisa do Instituto Locomotiva revelou ainda que 65% dos brasileiros gostariam de passar mais tempo com a família, e que nove em cada dez pessoas têm familiares morando longe.

Um desses casos é o da agricultora Adelina Maria de Jesus, de 67 anos, emocionada na rodoviária de Brasília por não conseguir reunir os quatro filhos no Natal. Com uma renda de um salário mínimo, os filhos estão espalhados pelo país em busca de trabalho. Duas filhas vivem em Águas Lindas de Goiás (GO).

Adelina e o marido vivem em um assentamento sem-terra em Rubiataba, a mais de 400 km de distância. “Tenho esperança de que um dia teremos dinheiro para nos reunirmos de verdade. Seria meu sonho de Natal”, desabafa. Há mais de 15 anos, eles não convivem juntos no feriado.

Manter a convivência é também o desejo da diarista Joselita da Conceição, de 51 anos, em Ituberá (BA). Ela, a filha Josielle e os dois netos estavam ansiosos não só para encarar as 19 horas de viagem de ônibus, mas para rever o mar e molhar os pés na praia.

“Quero que meus filhos convivam com os primos. No final do ano, é tempo para isso”, afirma Joselita, animada para a festa de Natal que os espera.