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Vendedora negra é demitida por usar tranças nagô em empresa de consórcios em Maceió

Vítima de racismo conta que gestora lhe deu dois dias para tirar a trança

Por Portal Eufemea 16/05/2025 15h03
Vendedora negra é demitida por usar tranças nagô em empresa de consórcios em Maceió
Por meio das redes sociais Gabriela contou que o caso ocorreu no início de março, quando decidiu adotar o penteado - Foto: Divulgação

A vendedora Gabriela Barros, de 23 anos, foi demitida de uma empresa de consórcios e cartas de crédito localizada no Centro de Maceió após adotar tranças nagô, um penteado tradicionalmente ligado à cultura negra.

Em relato publicado no Instagram, Gabriela contou que o caso ocorreu no início de março, quando decidiu adotar o penteado. Ao chegar para trabalhar, foi informada pela gestora da empresa de que aquele tipo de cabelo não era aceito no ambiente profissional.

“Coloquei uma trança bem pequena, uma nagô. Passei apenas um dia com ela, porque, quando cheguei ao trabalho, a gestora simplesmente mandou que eu retirasse. Como tinha contas a pagar e precisava me manter na empresa, aceitei e tirei a trança”, contou.

“Não era o perfil da empresa”


Semanas depois, Gabriela decidiu colocar uma nova trança, desta vez, segundo ela, “bem comum”, com o objetivo de não chamar atenção. Ainda assim, foi advertida. “Ela me chamou de canto e disse que eu tinha dois dias para tirar a trança. Afirmou que era perfil de loja de hippie, que não combinava com o perfil da empresa dela”, relatou.

Ao se recusar a retirar as tranças, Gabriela foi informada de que não deveria retornar ao trabalho. “Se você vier amanhã com a trança, vou colocar você para ir pra casa. Eu já te avisei. Tire essa trança hoje. Se for pra vir amanhã, nem venha”, disse a gestora em um áudio gravado pela funcionária.

No dia seguinte, Gabriela compareceu ao local de trabalho com as tranças. “Na frente de todo mundo, ela não fez nem questão de me chamar de canto. Ela me mandou embora”, afirmou.

Ainda segundo Gabriela, a negativa em relação ao penteado foi motivada por uma questão estética, e não funcional.

“Foi uma situação totalmente desconfortável, ter que ir pra casa por causa do cabelo”, relatou. “É um cabelo. Não vai interferir na questão de atendimento. Não é só estética. É também uma questão de ancestralidade.”

A gestora, em resposta, afirmou: “Mas eu não aceito. Você tem que entender que é o seu estilo de vida, e tem que entender as regras da empresa. A questão do cabelo pra mim interfere porque aqui é um escritório. Se você se vestisse com um estilo mais social, eu ainda aceitaria a tua trança.”

Dispensa discriminatória


O advogado de Gabriela, Pedro Gomes, classifica a demissão como uma dispensa discriminatória. Segundo ele, houve violação de direitos fundamentais ao condicionar a permanência da funcionária à retirada de um penteado ligado à identidade negra.

“Ao afirmar que não aceita tranças nagô, ao associar o cabelo à informalidade e condicionar a permanência da funcionária à retirada de um símbolo de identidade negra, há um claro conteúdo discriminatório”, afirmou.

A defesa informou que pretende acionar a Justiça com um pedido de indenização por danos morais. Pedro Gomes reforça que a legislação trabalhista admite exigências relacionadas ao cabelo apenas em casos muito específicos — o que não se aplica à situação de Gabriela.

“O empregador pode exigir um penteado padrão apenas quando houver uma justificativa plausível, como em casos de higiene para trabalhadores da cozinha ou da saúde, o que não é, nem de longe, o caso em questão”, explicou.

Para ele, ao rejeitar um cabelo com tranças nagô, associando-o a informalidade ou a festas como o carnaval, a atitude da empregadora evidencia racismo estrutural.

“Ao dizer que tal cabelo é diferente e comparar com algo utilizado em comemorações de carnaval, a empresa manifestou uma visão racista sobre um símbolo que remete à cultura negra”, concluiu.