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Com medo do coronavírus, pacientes adiam a busca por atendimento

Taxa média de ocupação das unidades privadas do país é de 40% a 50%. Médicos alertam para riscos da procura tardia por socorro

Por O Globo 16/04/2020 08h08
Com medo do coronavírus, pacientes adiam a busca por atendimento
Foto: Reprodução

Enquanto a Covid-19 se alastra, doenças crônicas e outras emergências não deixam de existir. Mas buscar atendimento nesses casos tem se tornado a última opção diante do medo de se contaminar.

Breno Monteiro, presidente da Confederação Nacional de Saúde, que representa hospitais, clínicas e laboratórios, estima que a taxa média de ocupação nas unidades privadas no país, entre leitos clínicos e UTIs, é de 40% a 50%. Já os laboratórios estão com até 80% da capacidade ociosa: 

— A base do sistema é o médico, e muitos consultórios não estão funcionando. O que resta aberto, então, é o pronto-socorro. Mas as pessoas estão com medo de ir lá. Os pré-natais, o controle de doenças cardíacas e renais, da diabetes... Nada está sendo feito como deveria. Uma dor precordial, que seria um sinal de infarto, levaria a pessoa direto ao hospital, mas hoje a tendência é postergar. E isso pode resultar numa evolução muito ruim. 

O cenário apontado por médicos é confirmado nos registros de atendimento em emergências e de internação hospitalar na rede privada. No Copa D’Or, na Zona Sul do Rio, houve uma redução de mais da metade de atendimentos diários na emergência. 

Segundo o diretor médico da unidade, Marcelo London, a emergência principal costumava atender cerca de 300 pessoas por dia. Hoje, o número não passa de 120. Já a ala separada para pacientes com sintomas respiratórios, de gripe, recebe entre 60 e 70. 

Ele reforça que os pacientes com suspeita de coronavírus são totalmente isolados e, que, por isso, não se deve temer buscar atendimento quando necessário. A triagem da emergência foi antecipada: um profissional pergunta os sintomas e direciona o paciente já na porta. Os que têm tosse, febre ou garganta inflamada são atendidos por especialistas com EPIs e recebem máscaras. 

London diz que os cerca de 700 médicos do hospital repassam a mensagem para seus pacientes de que tratamentos de doenças crônicas, acompanhamentos para cirurgia futura ou emergências não podem ser negligenciados. 

— Os leitos de terapia intensiva estão ocupados, em grande maioria, por pacientes com Covid-19. Havia muita admissão de pacientes que vinham com diagnósticos de septicemia de origem pulmonar, infecção urinária e cálculo renal. Mas essas pessoas não aparecem mais — diz London. 

Isso não significa, obviamente, que as doenças tenham sumido. London cita o caso recente de um paciente com apendicite aguda, com perfuração. Estava com medo de se tratar no hospital. O desfecho de doentes atendidos em estado crítico costuma ser mais complicado. 

Casos aparentemente mais brandos também preocupam. A aposentada Helena de Freitas, de 69 anos, moradora de Copacabana, quebrou o pé há dois meses. Foi ao Hospital São Lucas, em seu bairro, e saiu de lá com uma bota que deveria ser retirada em um mês. Com a pandemia, preferiu seguir com a imobilização: 

— Antes as dores que sinto do que pegar coronavírus. 

Daniel Coudry, CEO da Amil, conta que houve queda significativa nas 58 unidades próprias da operadora em que é feito o atendimento primário. Parte da mão de obra que está ociosa será remanejada para trabalhar no novo serviço de telemedicina que será lançado hoje pela operadora. 

— A proposta é abrir um canal para que a população não fique sem assistência. E iremos identificar casos de pacientes que precisam ser encaminhados para atendimento presencial — afirma Coudry.