Economia
Banco Central adia lançamento do Pix parcelado após casos de fraude e desvio de valores
Funcionalidade estava prevista para este mês, mas lançamento deve atrasar por pelo menos três meses.

Com o objetivo de reforçar a segurança do sistema financeiro, o Banco Central decidiu adiar o lançamento do Pix parcelado, funcionalidade que vem sendo desenvolvida pela autoridade monetária para ampliar o alcance do sistema de pagamentos instantâneos. Inicialmente prevista para ser lançada ainda neste mês, a nova função foi postergada, e a expectativa é que leve ao menos mais três meses para sair do papel.
O adiamento ocorre em meio ao registro de desvios milionários provocados por ataques cibernéticos e a investigações que apontam vínculos entre instituições financeiras e o Primeiro Comando da Capital (PCC), uma das principais facções criminosas do país. Diante desse cenário, o Banco Central optou por priorizar ações voltadas à segurança, deixando a agenda de inovações momentaneamente em segundo plano. Procurada, a instituição não se manifestou sobre o adiamento.
A funcionalidade do Pix parcelado foi pensada para padronizar as soluções de crédito que já são oferecidas por algumas instituições. O modelo prevê que o cliente possa parcelar pagamentos por meio da contratação automática de um empréstimo, enquanto o recebedor do valor o obtém à vista.
De acordo com o cronograma mais recente, divulgado pelo BC no fim de junho, a regulamentação da nova funcionalidade seria publicada em setembro, acompanhada dos manuais técnicos, como o guia de experiência do usuário. A partir de então, seria iniciado um período de convivência entre a nova solução e os modelos já utilizados pelo mercado, com previsão de término em março de 2026.
No entanto, o regulamento será agora divulgado apenas em outubro, enquanto o manual de experiência está previsto para dezembro. Fontes próximas às discussões estimam que o atraso no lançamento do Pix parcelado será de até três meses, sendo motivado pela necessidade de reforçar os mecanismos de segurança após os recentes ataques cibernéticos.
A decisão ocorre em um momento em que o Banco Central, sob a liderança de Gabriel Galípolo, busca fechar brechas regulatórias que têm sido exploradas por organizações criminosas. Com isso, a pauta de segurança passou a ganhar prioridade sobre a de inovação.
O novo posicionamento contrasta com a linha adotada pela instituição nos últimos anos, marcada pelo lançamento de produtos como o próprio Pix, em 2020, o Open Finance e os testes com o Drex, a moeda digital brasileira (CBDC). Apesar de essas iniciativas serem consideradas bem-sucedidas internamente, o BC avalia que agora é preciso garantir a solidez do sistema financeiro antes de seguir com novos avanços tecnológicos.
Um reflexo dessa mudança foi o pacote de medidas anunciado no início de setembro. Entre as ações, o BC antecipou o calendário para autorização obrigatória de instituições de pagamento (IPs), endureceu regras para provedores de tecnologia que interligam instituições ao sistema financeiro e impôs um teto de R$ 15 mil por transação via Pix ou TED para IPs sem licença. Além disso, passou a exigir a rejeição de operações com indícios consistentes de fraude.
Outras medidas ainda estão previstas para este semestre, como a regulamentação de contas laranja, contas-bolsão e criptoativos. Parte dessas ações já vinha sendo estudada, mas foi acelerada devido à escalada dos crimes financeiros.
Outro movimento da autarquia foi a abertura de uma consulta pública para endurecer a regulação sobre os serviços de eFX, que consistem em intermediários de pagamentos e transferências internacionais. Essa modalidade foi criada em 2021 com o objetivo de fomentar a competição no mercado cambial, permitindo a atuação de IPs sem licença como operadores internacionais.
O advogado Aylton Gonçalves, especialista em Regulação dos Mercados Financeiro e de Capitais, avalia que o modelo de eFX é relevante por abrir portas para novos entrantes em um setor tradicionalmente fechado. No entanto, ele ressalta a dificuldade de o BC manter visibilidade sobre as operações desses intermediários.
"Podemos notar uma tentativa do Banco Central de retomar o controle de atividades reguladas que, de alguma maneira, poderiam fugir de seu perímetro regulatório. É o que acontece, de modos diferentes, nas estruturas de eFX e de Banking as a Service, no caso de conta-bolsão" afirmou Gonçalves.
Ele avalia que a gestão atual do BC carrega um legado importante de políticas voltadas à ampliação da concorrência, mas agora busca equilibrar inovação com segurança e estabilidade.
Na mesma linha, Luiz Henrique Barbosa, diretor-executivo da Swarmy Tecnologia, empresa especializada em segurança e prevenção de fraudes digitais, acredita que as novas medidas podem significar, num primeiro momento, um freio na inovação, já que aumentam os custos para as instituições. No entanto, ele aponta que, com a correção de rota, o sistema tende a se tornar mais resiliente e apto a receber inovações mais estruturadas no futuro.
