Ciência, tecnologia e inovação
Homem é curado do HIV após transplante de células-tronco em caso considerado inesperado
Procedimento usado para tratar câncer elimina o vírus pela sétima vez na história e amplia perspectivas para novas abordagens contra a infecção
Pela sétima vez, um paciente vivendo com HIV teve o vírus completamente eliminado do organismo após um transplante de células-tronco realizado inicialmente para tratar um câncer hematológico. O caso, divulgado nessa segunda-feira (2), em um estudo publicado na revista Nature, coincide com o Dia Mundial de Combate à Aids e representa mais um avanço em uma área da ciência ainda repleta de incertezas, mas cada vez mais promissora.
O paciente, apelidado de “B2” pelos pesquisadores, recebeu o diagnóstico de HIV em 2009 e, anos depois, de leucemia mieloide aguda (LMA). Em 2015, como parte do tratamento contra o câncer, passou por um transplante de células-tronco que acabou resultando na eliminação do vírus — um efeito indireto do procedimento oncológico, e não seu objetivo principal.
Casos anteriores de cura envolviam doadores com uma rara mutação genética conhecida como CCR5 Δ32 nas duas cópias do gene que codifica o receptor usado pelo HIV para invadir células. Essa alteração impede que o vírus encontre a “porta de entrada” no organismo.
No entanto, o doador de B2 possuía apenas uma cópia da mutação e outra comum — combinação considerada insuficiente para bloquear o HIV. Mesmo assim, seis anos após interromper o tratamento antirretroviral, o paciente não apresenta qualquer sinal do vírus. O próprio B2 tem a mesma combinação genética, o que não o protegeu da infecção original, mas adiciona complexidade à compreensão do resultado final.
Desde o avanço dos antirretrovirais, o HIV deixou de ser uma sentença de morte. Em países com acesso adequado ao tratamento, pessoas vivendo com o vírus têm expectativa de vida semelhante à da população geral. Ainda assim, um pequeno e crescente grupo de indivíduos tem alcançado a cura completa ou funcional — quase sempre após procedimentos intensivos relacionados ao tratamento de cânceres hematológicos.
O marco inicial desses casos ocorreu em 2008, com Timothy Ray Brown, o primeiro paciente a ser declarado curado do HIV após dois transplantes de células-tronco de um doador com a mutação CCR5 Δ32. Desde então, outros cinco pacientes seguiram caminhos semelhantes.
Apesar dos avanços, o transplante de células-tronco continua sendo um procedimento de alto risco, associado a efeitos colaterais graves, elevada mortalidade e custos muito elevados. A busca por doadores compatíveis também exige bancos de dados internacionais extensos, tornando a técnica inviável como tratamento padrão para pessoas que vivem com HIV.
Por isso, os antirretrovirais permanecem como a abordagem mais segura, eficaz e acessível atualmente.
O sétimo caso de cura reforça a possibilidade de eliminar o HIV do organismo em situações específicas, mesmo quando as características genéticas do transplante não seguem o padrão considerado ideal até agora. Para os cientistas, cada paciente curado representa uma nova peça que ajuda a decifrar os caminhos possíveis para, no futuro, desenvolver terapias menos agressivas e mais acessíveis.
Enquanto isso, o caso B2 acende novas esperanças e destaca o papel da pesquisa científica na construção de um cenário mais otimista para quem convive com o vírus.

