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Nobel de Fisiologia ou Medicina premia responsáveis pelas vacinas de mRNA contra Covid-19

Katalin Karikó e Drew Weissman lançaram as bases para o desenvolvimento de imunizantes administrados mais de 13 bilhões de vezes em todo o mundo nos últimos anos

Por Gov 05/02/2024 12h12 - Atualizado em 06/02/2024 15h03
Nobel de Fisiologia ou Medicina premia responsáveis pelas vacinas de mRNA contra Covid-19
Vacina contra covid-19 - Foto: G1

A bioquímica húngara Katalin Karikó e o imunologista estadunidense Drew Weissman foram os vencedores do Nobel de Fisiologia ou Medicina de 2023. Suas pesquisas permitiram o desenvolvimento de vacinas de RNA mensageiro (mRNA) eficazes contra o novo coronavírus (Sars-CoV-2) em menos de um ano, evitando dezenas de milhares de mortes e ajudando o mundo a se recuperar da pior pandemia em mais de um século.

O anúncio, feito pelo Instituto Karolinska, na Suécia, deu-se na segunda-feira, 2 de outubro de 2023, abrindo a temporada de premiações nas categorias científicas deste ano.

As vacinas contra a Covid-19 desenvolvidas pelas farmacêuticas estadunidenses Moderna e Pfizer — esta última em colaboração com a alemã BioNTech — baseiam-se no uso de moléculas sintéticas de mRNA do Sars-CoV-2 contendo a receita química para a produção da proteína spike (S), usada pelo patógeno para se conectar às células humanas e invadi-las. Dentro das células, essas moléculas desencadeiam uma resposta imunológica que prepara o organismo para combater o vírus real.

Por muito tempo essa estratégia foi considerada inviável porque a injeção de mRNA no corpo desencadeava uma reação imunológica que destruía a molécula quase que imediatamente, podendo também causar danos ao organismo.

Karikó, que nasceu em Szolnok, na Hungria, em 1955, mas migrou para os Estados Unidos nos anos 1980, e Weissman, nascido em Lexington, Massachusetts, em 1959, começaram a trabalhar juntos nesse problema na Universidade da Pensilvânia (UPenn) em fins da década de 1990.

Eles perceberam que essa reação imunológica estava ligada a uma diferença fundamental entre os mRNAs produzidos em células de mamíferos e aqueles produzidos por cientistas em laboratório: os mRNAs naturais tinham alterações químicas que não constavam nos mRNAs sintétivos. Eles, então, decidiram acrescentar uma modificação na versão sintética das bases nitrogenadas do mRNA antes de injetá-la no organismo.

A estratégia deu certo. Em 2005, Karikó e Weissman publicaram um artigo na revista Immunity — após o mesmo ter sido recusado pelas revistas Nature e Science — explicando que o segredo era trocar um dos nucleotídeos do mRNA artificial — nesse caso, a uridina pela pseudouridina.

Essa substituição fazia com que os sensores do organismo não identificassem a molécula de mRNA sintético como uma ameaça. Dessa forma, ela tinha passagem livre até a célula, seu objetivo final.

Nos anos seguintes, a dupla produziu outros dois trabalhos, publicados em 2008 na Molecular Therapy e em 2010 na Nucleic Acids Research, nos quais mostrava que o uso da pseudouridina poderia aumentar a quantidade de proteína produzida pelas células que captavam o mRNA sintético, estimulando a ativação do sistema imune. Eles também desvendaram o mecanismo celular por trás de seus resultados.

Esses trabalhos foram usados por várias empresas nos anos 2010 envolvidas no desenvolvimento de vacinas contra o vírus zika e o Mers-CoV, responsável pela Síndrome Respiratória do Oriente Médio.

Essas investigações foram fundamentais para o rápido desenvolvimento de vacinas capazes de entregar a receita para a produção da proteína S do Sars-CoV-2 em células humanas logo após o início da pandemia de Covid-19, em 2020. As primeiras autorizações para as vacinas de mRNA foram dadas em dezembro daquele ano à iniciativa Pfizer-BioNTech — que até recentemente empregava Karikó como vice-presidente sênior — e à Moderna.

Desde o início da pandemia, as vacinas contra o novo coronavírus baseadas na tecnologia de mRNA foram administradas mais de 13 bilhões de vezes em todo o mundo.

Existem agora vacinas de mRNA em desenvolvimento para outras doenças, incluindo gripe, HIV, malária e zika. “Esta é uma escolha maravilhosa para o Nobel”, disse à revista Science o médico Anthony Fauci, ex-diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos. “É o exemplo clássico de uma colaboração de anos em um problema muito difícil. Eles persistiram e fizeram uma descoberta que já transformou muitas áreas da pesquisa biomédica.”

Karikó é a 13ª mulher a ganhar o Nobel de Fisiologia ou Medicina. “Esperamos que este prêmio inspire mulheres, imigrantes e todos os jovens a perseverarem e a serem resilientes”, disse a bioquímica à Nature. Ela e Weissman dividirão o prêmio de 11 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 5 milhões), a ser entregue em uma cerimônia no final do ano.