Falando de Direito

Blog do advogado, professor de Direito da Universidade Federal de Alagoas (Ufal ), membro da Academia Alagoana de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. 

A RESCISÃO UNILATERAL DE CONTRATOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO E OS DIREITOS DO PRESTADOR DE SERVIÇOS:

Por Fernando Maciel 30/10/2025 10h10
A RESCISÃO UNILATERAL DE CONTRATOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO E OS DIREITOS DO PRESTADOR DE SERVIÇOS:
Fernando Maciel - Foto: Assessoria

No Brasil, os contratos de prestação de serviços são fundamentais para o funcionamento da economia, envolvendo tanto pessoas físicas quanto jurídicas. A legislação que regulamenta esses contratos, porém, pode ser complexa, exigindo clareza e precisão para proteger os direitos de ambas as partes. Uma situação particularmente delicada surge em casos de rescisão unilateral, onde a parte que rescinde pode incorrer em indenização. Este artigo focará na importante decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a aplicação do artigo 603 do Código Civil para pessoas jurídicas, um marco para o direito contratual brasileiro.

O artigo 603 do Código Civil Brasileiro dispõe sobre a rescisão unilateral de contratos de prestação de serviço por parte do contratante (tomador do serviço). Ele estabelece que, em caso de rescisão sem justa causa, o prestador de serviços (prestador) tem direito à indenização correspondente às parcelas vencidas e à metade das parcelas a vencer.


Imagine, por exemplo, que uma empresa contrata um freelancer para desenvolver um software por 6 meses, com pagamento mensal de R$ 5.000,00. Se a empresa rescindir o contrato após 3 meses sem justa causa, o freelancer terá direito a receber R$ 15.000,00 (3 meses já trabalhados) + R$ 7.500,00 (metade dos 3 meses restantes), totalizando R$ 22.500,00. Essa indenização visa compensar o prestador pelos prejuízos causados pela rescisão antecipada, considerando o trabalho já realizado e a perda de oportunidades futuras.

A aplicação deste artigo, entretanto, não era uniforme em casos envolvendo pessoas jurídicas.

Antes da decisão do STJ, existia um amplo debate jurídico sobre a aplicabilidade do artigo 603 a pessoas jurídicas. Alguns autores argumentavam que a norma se restringia apenas a pessoas físicas, considerando que a personalidade jurídica das empresas as diferenciava dos prestadores autônomos, geralmente representados por indivíduos. Outros, contudo, defendiam a interpretação extensiva do artigo, considerando a natureza da relação contratual e a proteção necessária ao prestador de serviço, independentemente de sua natureza jurídica. A doutrina e a jurisprudência, portanto, apresentavam entendimentos divergentes, gerando insegurança jurídica para as empresas prestadoras de serviços.

A Terceira Turma do STJ, sob a relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, decidiu em favor da extensão da proteção do artigo 603 às pessoas jurídicas, em julgamento que estabeleceu um precedente importante para o direito contratual. Embora o número do processo não seja fornecido aqui para garantir a confidencialidade da relação, a decisão representou um avanço significativo na proteção de empresas prestadoras de serviço, equiparando-as, em relação aos direitos de indenização por rescisão unilateral, às pessoas físicas. O tribunal argumentou que a intenção da lei é proteger o prestador de serviços, independente de sua natureza jurídica, e que negar a aplicabilidade do artigo 603 às pessoas jurídicas seria discriminatório e incompatível com os princípios da boa-fé e da proteção contratual.

A decisão do STJ aumenta a segurança jurídica para as empresas prestadoras de serviço, fornecendo um amparo legal em situações de rescisão unilateral de contratos. Isso significa que as empresas podem se valer da legislação para exigir a indenização prevista no artigo 603, reduzindo os riscos financeiros decorrentes da interrupção de contratos sem justa causa. Considere, por exemplo, uma empresa de consultoria que teve seu contrato de prestação de serviços rescindido antecipadamente por uma grande empresa. Com a decisão do STJ, a empresa de consultoria pode exigir a indenização, garantindo seu direito a receber pelos serviços prestados e o lucro cessante.

Para se protegerem ainda mais, as empresas prestadoras de serviço podem adotar as seguintes medidas:

● Elaborar contratos claros e detalhados: Definindo com precisão os serviços a serem prestados, o prazo, o valor da remuneração e as condições de rescisão.
● Incluir cláusulas específicas sobre rescisão:
Estabelecendo o direito à indenização em caso de rescisão unilateral e definindo os critérios para o cálculo dessa indenização.
● Utilizar cláusulas de penalidades contratuais: Prevendo multas ou outras sanções em caso de descumprimento contratual por parte do contratante.
● Manter registros detalhados do trabalho realizado: Para comprovar a execução dos serviços e o valor do trabalho já realizado.
● Buscar aconselhamento jurídico: Para garantir a conformidade legal dos contratos e a proteção dos seus direitos.

Considerando a decisão do STJ, a elaboração de contratos de prestação de serviços requer atenção redobrada. É crucial incluir cláusulas que protejam os interesses de ambas as partes. Algumas cláusulas importantes a serem consideradas são:

● Objeto do contrato: Descrição detalhada dos serviços a serem prestados. Exemplo: "A prestadora se compromete a desenvolver um software com as funcionalidades especificadas no Anexo I."
● Prazo de execução: Data de início e término do contrato. Exemplo: "O prazo de execução do presente contrato é de 12 meses, com início em 01/01/2024 e término em 31/12/2024."
● Forma de pagamento: Valor e forma de pagamento dos serviços. Exemplo: "O pagamento será realizado mensalmente, no valor de R$ 10.000,00, até o dia 10 de cada mês."
● Cláusula de rescisão: Condições de rescisão e consequências para cada parte. Exemplo: "Em caso de rescisão antecipada sem justa causa pelo contratante, a prestadora terá direito à indenização prevista no artigo 603 do Código Civil."
● Cláusula de confidencialidade: Protegendo informações sigilosas.

A decisão do STJ certamente influenciará a jurisprudência futura, consolidando a proteção do artigo 603 para pessoas jurídicas. Apesar disso, ainda podem surgir controvérsias, principalmente em casos com complexidade fática maior. A interpretação e aplicação do artigo, em situações específicas, demandará análise cuidadosa do caso concreto. Por isso, a busca por aconselhamento jurídico especializado é fundamental para a elaboração e interpretação de contratos, minimizando riscos e garantindo a proteção dos direitos de ambas as partes.

A decisão do STJ sobre a aplicabilidade do artigo 603 do Código Civil às pessoas jurídicas representa um importante avanço para o direito contratual brasileiro, garantindo maior segurança jurídica para empresas prestadoras de serviços. A clareza contratual, a proteção dos direitos e a busca por aconselhamento jurídico são essenciais para evitar conflitos e garantir o bom funcionamento das relações comerciais. Não hesite em buscar auxílio de profissionais qualificados para proteger seus direitos e assegurar a eficácia dos seus contratos.

News title
Pesquise no blog
Sobre o blog

ADVOGADO, PROFESSOR DA FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS, MEMBRO DA ACADEMIA ALAGOANA DE LETRAS ONDE OCUPA A CADEIRA NÚMERO 18 QUE TEM POR PATRONO MANOEL JOAQUIM FERNANDES DE BARROS E DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE ALAGOAS NA CADEIRA NÚMERO 27 QUE TEM POR PATRONO ANTÔNIO GUEDES DE MIRANDA E DA CONFRARIA QUEIROSIANA –AMIGOS DO SOLAR CONDES DE RESENDE – NO GRAU DE LEITOR – VILA NOVA DE GAIA – PORTUGAL. AUTOR DOS LIVROS : “FALANDO DE DIREITO.”- EDITORA CATAVENTO – MACEIÓ,AL.- 2008, “POEMAS DA ADOLESCÊNCIA.” - EDITORA CATAVENTO – MACEIÓ,AL.- 2008; “POEMAS ILEGAIS E OUTROS VERSOS” – IMPRENSA OFICIAL GRACILIANO RAMOS – MACEIÓ, AL. – 2015; “ VÍCIOS REDIBITÓRIOS” IN A TEORIA DO CONTRATO E O NOVO CÓDIGO CIVIL. EDITORA NOSSA LIVRARIA – RECIFE, PE – 2003; “CAPACIDADE E ENTES NÃO PERSONIFICADOS” – EDITORA JURUÁ- CURITIBA, PR – 2001.

Arquivo