Falando de Direito

Blog do advogado, professor de Direito da Universidade Federal de Alagoas (Ufal ), membro da Academia Alagoana de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. 

TESTAMENTO CERRADO: O QUE É E O STJ E A PRESUNÇÃO DE CAPACIDADE DO TESTADOR.

Por Fernando Maciel 05/09/2025 09h09
TESTAMENTO CERRADO: O QUE É E O STJ E A PRESUNÇÃO DE CAPACIDADE DO TESTADOR.
Fernando Maciel - Foto: Assessoria

Este artigo analisa um importante precedente estabelecido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) envolvendo um testamento cerrado. O caso trata de um idoso sem filhos, que, assistido por sobrinhos e sobrinhas, elaborou seu sexto testamento, beneficiando majoritariamente um sobrinho específico. Outros parentes contestaram o testamento alegando incapacidade
do testador e irregularidades na formalização do ato no cartório. A decisão do STJ neste caso reforça a presunção de capacidade do testador e a necessidade de provas robustas para invalidar um testamento. Este precedente possui grande relevância para o direito sucessório, estabelecendo parâmetros importantes para a análise de casos futuros.

O testamento cerrado é um ato unilateral, solene e revogável, pelo qual o testador manifesta sua última vontade, escrita de próprio punho, e fechada em envelope, sem que o tabelião ou qualquer outra pessoa tenha conhecimento do conteúdo. Difere do testamento público, onde o tabelião participa da redação e assinatura do documento.

Para a validade do testamento cerrado, são necessários:

A escrita do testamento pelo próprio testador ou a seu rogo, sendo este caso devidamente declarado, em sua própria letra.

A assinatura pelo testador, e se não souber escrever, a assinatura de duas testemunhas que comprovem sua impossibilidade de escrever.

O fechamento e lacre do envelope pelo testador, na presença de três testemunhas.

O ato de assinatura das testemunhas, na presença do tabelião, no envelope lacrado.

A entrega do envelope lacrado ao tabelião para guarda.

A presença de testemunhas e do tabelião (ou servidor autorizado, como veremos adiante) é crucial para garantir a autenticidade e a segurança do ato. O testamento cerrado confere privacidade
ao testador, pois seu conteúdo só é revelado após sua morte.

No dito julgado, os parentes que contestavam o testamento argumentaram que a elaboração de seis testamentos demonstrava a incapacidade

do testador. Alegaram que a repetida alteração da disposição de bens indicava um estado de confusão mental, comprometendo sua capacidade civil para testar.

A capacidade civil para testar é prevista em lei e exige o pleno discernimento do testador. A avaliação judicial da capacidade se dá através da análise do contexto fático, considerando idade, saúde física e mental, e o grau de compreensão do ato praticado. No entanto, a lei presume a capacidade civil, cabendo à parte que a contesta demonstrar o contrário. A simples existência de múltiplos testamentos, sem demonstração efetiva de incapacidade, não configura, por si só, prova robusta o suficiente para invalidá-los.

Os parentes também argumentaram sobre uma suposta irregularidade na formalização do testamento, alegando que uma servidora do cartório atuou no lugar do tabelião. O STJ, no entanto, refutou esse argumento, fundamentando sua decisão na teoria da aparência e na boa-fé do testador. Foram os seguintes os argumentos:

Boa-fé do testador:

O testador agiu de boa-fé, acreditando na legitimidade da servidora para realizar o ato. Ele não tinha conhecimento de qualquer irregularidade.

Teoria da aparência: A servidora atuou com a aparência de autoridade competente, criando uma situação que induziu o testador à boa-fé. A aparência de legalidade do ato prevalece.

Presunção de legitimidade da servidora: O STJ considerou que, a menos que comprovado o contrário, havia a presunção de legitimidade e autorização da servidora para realizar a função em nome do tabelião.

A consequência da aplicação da teoria da aparência é que a irregularidade, mesmo existente, não prejudicou a validade do ato para o testador, que agiu com boa-fé.

A Quarta Turma do STJ, em decisão unânime, confirmou a validade do testamento, embasada no voto do Ministro Antônio Carlos Ferreira. O Ministro enfatizou a presunção de capacidade do testador, ressaltando que o ônus da prova para demonstrar a incapacidade recai sobre aqueles que a alegam. Ele destacou a ausência de provas robustas que comprovassem a alegada incapacidade, além da aplicação da teoria da aparência, confirmando a validade do ato mesmo com a possível irregularidade na formalização do testamento pelo cartório.

A decisão do STJ estabelece um importante precedente para casos futuros, reforçando a presunção de capacidade em testamentos cerrados e a necessidade de provas contundentes para contestar sua validade. Este entendimento contribui para a segurança jurídica no direito sucessório, protegendo a vontade do testador, desde que observadas as formalidades legais. A jurisprudência deverá se inspirar nesse julgamento, exigindo um grau maior de prova nos casos de contestação de testamentos baseados em alegações de incapacidade.

Este caso demonstra a importância de observar rigorosamente as formalidades legais na elaboração de testamentos. A assessoria de um advogado especializado é fundamental para garantir a validade do ato e evitar futuras contestações. A presunção de capacidade do testador, embora seja um princípio importante, não é absoluta, podendo ser afastada por meio de provas convincentes de sua incapacidade. A decisão do STJ reforça a necessidade de um equilíbrio entre a proteção da vontade do testador e a garantia da capacidade civil.

A presunção de capacidade do testador é um princípio fundamental no direito sucessório, exigindo provas robustas para sua contestação. A decisão do STJ neste caso representa um importante marco para a consolidação desta presunção, assegurando a segurança jurídica e a prevalência da vontade do testador. A decisão do STJ demonstra a importância da presunção de capacidade e consolida a necessidade de provas robustas para a invalidação de testamentos.

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Sobre o blog

ADVOGADO, PROFESSOR DA FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS, MEMBRO DA ACADEMIA ALAGOANA DE LETRAS ONDE OCUPA A CADEIRA NÚMERO 18 QUE TEM POR PATRONO MANOEL JOAQUIM FERNANDES DE BARROS E DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE ALAGOAS NA CADEIRA NÚMERO 27 QUE TEM POR PATRONO ANTÔNIO GUEDES DE MIRANDA E DA CONFRARIA QUEIROSIANA –AMIGOS DO SOLAR CONDES DE RESENDE – NO GRAU DE LEITOR – VILA NOVA DE GAIA – PORTUGAL. AUTOR DOS LIVROS : “FALANDO DE DIREITO.”- EDITORA CATAVENTO – MACEIÓ,AL.- 2008, “POEMAS DA ADOLESCÊNCIA.” - EDITORA CATAVENTO – MACEIÓ,AL.- 2008; “POEMAS ILEGAIS E OUTROS VERSOS” – IMPRENSA OFICIAL GRACILIANO RAMOS – MACEIÓ, AL. – 2015; “ VÍCIOS REDIBITÓRIOS” IN A TEORIA DO CONTRATO E O NOVO CÓDIGO CIVIL. EDITORA NOSSA LIVRARIA – RECIFE, PE – 2003; “CAPACIDADE E ENTES NÃO PERSONIFICADOS” – EDITORA JURUÁ- CURITIBA, PR – 2001.

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