Falando de Direito

Blog do advogado, professor de Direito da Universidade Federal de Alagoas (Ufal ), membro da Academia Alagoana de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. 

DÍVIDAS BANCÁRIAS E BLOQUEIO DE CONTAS: O QUE É LEGAL E O QUE NÃO É?

Por Fernando Maciel1 23/06/2025 13h01
DÍVIDAS BANCÁRIAS E BLOQUEIO DE CONTAS: O QUE É LEGAL E O QUE NÃO É?
Fernando Maciel traz em seu currículo uma experiência acadêmica e profissional vasta - Foto: Assessoria

Em tempos de instabilidade financeira, é comum que pessoas enfrentem dificuldades para manter suas contas em dia. Quando se trata de dívidas bancárias, entretanto, surgem dúvidas sobre os limites da atuação das instituições financeiras, especialmente no que diz respeito ao bloqueio de contas bancárias. Afinal, o banco pode bloquear minha conta por dívida? Isso é legal? O que diz a legislação brasileira?

Neste artigo, vamos explicar quais atitudes são permitidas por lei, quais são consideradas abusivas e o que você pode fazer, juridicamente, caso se veja diante de uma situação como essa.

Dívidas bancárias são aquelas contraídas com instituições financeiras, como empréstimos pessoais, cartão de crédito, cheque especial, financiamentos ou parcelamentos oferecidos pelos bancos. Quando o cliente não paga a dívida no prazo, o banco pode aplicar uma série de medidas para tentar recuperar os valores, como: cobrança de juros e multas; negativação do CPF ou CNPJ nos órgãos de proteção ao crédito; contato com o cliente para renegociação (cobrança extrajudicial); Executar judicialmente o contrato (cobrança judicial), dentre outras medidas judiciais ou extrajudiciais.

Nem todas as medidas adotadas pelos bancos, entretanto, estão de acordo com a lei.

O banco pode bloquear por conta própria minha conta por dívida? Ou retirar dela valores para pagamento de uma dívida? Essas são dúvidas comuns, e a resposta é: não.

De acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do que determina o Código de Defesa do Consumidor (CDC), bem como o Código Civil Brasileiro, essa prática é considerada abusiva e ilegal. O banco não pode, sem ordem judicial, ou autorização expressa do cliente, retirar valores da sua conta corrente, aplicações ou poupança para quitar uma dívida vencida com a própria instituição.

Essa ação é chamada de autocompensação e ocorre quando a instituição utiliza um crédito que o cliente tem (por exemplo, saldo em conta ou depósito em poupança) para quitar um débito vencido automaticamente. Essa prática é vedada pela jurisprudência majoritária, e por lei, especialmente quando envolve conta salário ou valores de natureza alimentar.

Se o banco desejar bloquear valores em uma conta corrente ou aplicação financeira para usá-los para recebimento de seus créditos, somente poderá fazê-lo através de ordem judicial mediante o devido processo legal.

Outro ponto importante: a conta salário possui proteção legal. Ela foi criada para receber exclusivamente salários, aposentadorias e pensões, e, por isso, não pode ser bloqueada ou ter valores debitados sem autorização do cliente, salvo decisão judicial, nas hipóteses legais.

O artigo 833, inciso IV, do Código de Processo Civil, garante a impenhorabilidade de valores de natureza alimentar, justamente para assegurar a subsistência do devedor e de sua família. Tal regra foi flexibilizada pelos tribunais superiores em situações especificas e limitadas a percentual que não comprometa a sobrevivência financeira do titular da conta salário.

O que o banco pode fazer legalmente afinal?

Embora o bloqueio unilateral da conta não seja permitido, o banco pode: Negativar o nome do devedor nos órgãos de proteção ao crédito (como SPC e Serasa); Entrar com ação judicial de cobrança ou execução; Solicitar, por meio judicial, o bloqueio de valores, por exemplo, por meio do sistema BacenJud (atualmente Sisbajud), desde que haja um processo judicial em curso e um juiz determine o bloqueio; Cobrar juros e encargos legais sobre a dívida, dentre outras medidas. Em resumo, o banco precisa recorrer ao Poder Judiciário caso queira bloquear valores de um devedor inadimplente.

Mas, e se o banco bloquear indevidamente tais valores do cliente inadimplente, sem autorização judicial ou fizer a auto compensação? Ai o cliente poderá registrar uma reclamação no Procon ou no Banco Central do Brasil; Procurar um advogado de sua confiança para avaliar a possibilidade de ingressar com uma ação judicial; Pedir o estorno dos valores descontados indevidamente; Solicitar indenização por danos morais, caso o bloqueio ou desconto tenha causado prejuízos relevantes (como, por exemplo, impossibilidade de pagar contas básicas, aluguel, ou alimentação), entre outras medidas legais. O entendimento dos tribunais é de que a retenção indevida de valores configura conduta ilícita, podendo gerar dever de indenizar.

É importante destacar que somente o Poder Judiciário pode autorizar o bloqueio de contas, e isso dentro dos limites legais. Ainda assim, há valores que são impenhoráveis, mesmo com decisão judicial, como: Salários, aposentadorias e pensões (até o limite de 50 salários mínimos); Valores depositados em caderneta de poupança até 40 salários mínimos; Benefícios assistenciais e de natureza alimentar, e valores que de forma geral comprometam a sobrevivência dos devedores.

Caso você esteja sendo cobrado de forma indevida ou tenha tido valores bloqueados ilegalmente, o Poder Judiciário é o caminho adequado para buscar a reparação dos seus direitos.

Dívidas bancárias devem ser levadas a sério, mas isso não significa que o banco tenha poder ilimitado para agir contra o consumidor. Bloquear contas, realizar descontos automáticos ou transferir valores sem autorização são práticas ilegais, salvo com ordem judicial expressa.

Se você está passando por esse tipo de problema, busque orientação jurídica, reúna documentos e provas, e não deixe de lutar por seus direitos. A legislação brasileira, especialmente o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil, oferece mecanismos de proteção contra abusos por parte das instituições financeiras.

1 Advogado, Professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Alagoas, Mestre em Direito, poeta, escritor e membro da Academia Alagoana de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas.

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Sobre o blog

ADVOGADO, PROFESSOR DA FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS, MEMBRO DA ACADEMIA ALAGOANA DE LETRAS ONDE OCUPA A CADEIRA NÚMERO 18 QUE TEM POR PATRONO MANOEL JOAQUIM FERNANDES DE BARROS E DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE ALAGOAS NA CADEIRA NÚMERO 27 QUE TEM POR PATRONO ANTÔNIO GUEDES DE MIRANDA E DA CONFRARIA QUEIROSIANA –AMIGOS DO SOLAR CONDES DE RESENDE – NO GRAU DE LEITOR – VILA NOVA DE GAIA – PORTUGAL. AUTOR DOS LIVROS : “FALANDO DE DIREITO.”- EDITORA CATAVENTO – MACEIÓ,AL.- 2008, “POEMAS DA ADOLESCÊNCIA.” - EDITORA CATAVENTO – MACEIÓ,AL.- 2008; “POEMAS ILEGAIS E OUTROS VERSOS” – IMPRENSA OFICIAL GRACILIANO RAMOS – MACEIÓ, AL. – 2015; “ VÍCIOS REDIBITÓRIOS” IN A TEORIA DO CONTRATO E O NOVO CÓDIGO CIVIL. EDITORA NOSSA LIVRARIA – RECIFE, PE – 2003; “CAPACIDADE E ENTES NÃO PERSONIFICADOS” – EDITORA JURUÁ- CURITIBA, PR – 2001.

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