Gaspar 'joga para a plateia' e assiste fracasso de manobra de deputados para favorecer Bolsonaro
Mas Câmara invoca harmonia dos poderes e recorre para manter decisão sobre Caso Ramagem

Ao relatar o projeto que visava paralisar, no Supremo Tribunal Federal, a ação penal contra o deputado federal Alexandre Ramagem, do PL do Rio de Janeiro, o alagoano Alfredo Gaspar de Mendonça, do União Brasil, assumiu o risco de colocar em xeque a formação jurídica que lhe rendeu, antes de ingressar na política, o comando do Ministério Público de Alagoas.
Conferiu-lhe, também, pela firmeza de suas posições, o convite (aceito de pronto em 2015) do então governador Renan Filho (MDB) para comandar a Segurança Pública alagoana, missão, aliás, cumprida com extrema competência, tanto que, logo nos primeiros anos, resgatou Alagoas do topo da criminalidade nacional.
Só para lembrar, o desempenho como secretário de Segurança logo projetou Gaspar como 'nome potencial' no cenário político estadual, a ponto de ter sido escolhido para concorrer à Prefeitura de Maceió em 2020, numa campanha marcada pelo insucesso nas urnas unicamente por falha no 'planejamento político'.
Dois anos depois, contudo, o já conhecido bolsonarista Alfredo Gaspar ressurgiu com força e conquistou o mandato de deputado federal ostentando a condição de segundo mais votado em Alagoas - com mais de 100 mil votos.
Voltando ao presente, indicado para relatar a proposta que interrompia o julgamento da ação penal contra Alexandre Ramagem, Alfredo Gaspar não hesitou em apresentar um relatório flagrantemente contrário à disposição contida na Constituição Federal. Atendia, contudo, ao coro da oposição.
A própria Câmara dos Deputados havia sido alertada, pelo STF, para a inconstitucionalidade da matéria concebida por deputados oposicionistas para beneficiar Ramagem e outros envolvidos na trama golpista que resultou nos atentados de 8 de Janeiro de 2023, sendo o principal deles o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Ao compor seu arrazoado, Gaspar preferiu 'jogar para a plateia', exibindo destemor, mas, por conta da afronta ao dispositivo constitucional, acabou pagando para assistir ao fracasso da decisão tomada pela maioria dos parlamentares.
Isso porque o texto a favor de Alexandre Ramagem foi aprovado por 315 votos a favor e 143 contrário, e não precisou passar pelo Senado, o que levou o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), a promulgar a proposta e comunicar de imediato a decisão ao Supremo Tribunal, mas o efeito foi breve.
Por curto espaço de tempo, Alfredo Gaspar até pôde comemorar a aprovação de seu relatório, que era genérico e não restringia a paralisação da ação penal ao nome de Ramagem, ou seja, abria brecha para que o processo como um todo fosse paralisado e, dessa forma, conforme análise de deputados oposicionistas, acabasse por beneficiar Jair Bolsonaro e outros réus.
Porém, sem choque, como aconteceria com um 'analfabeto jurídico', Alfredo Gaspar viu - com igual velocidade ao ritmo de aprovação na Câmara - o Supremo Tribunal derrubar a manobra que usava o caso Ramagem para alcançar o denunciado ex-presidente Bolsonaro.
Em síntese, Gaspar desconsiderou um princípio constitucional básico: a imunidade parlamentar - invocada para estancar a ação contra o deputado Ramagem - não vale para crimes cometidos antes da diplomação do parlamentar eleito, e acontece que o deputado carioca responde a processo por participação direta e pessoal na trama que conduziu aos atos golpistas do 8 de Janeiro.
O episódio pode não produzir efeitos contrários ao projeto eleitoral de Gaspar para 2026, mas, sem nenhuma dúvida, compromete a retidão que pontilhava seus atos como procurador-geral de Justiça e, portanto, como conhecedor do texto constitucional em vigor desde a promulgação da Carta Magna em 1988.
Em tempo : nesta terça-feira (13), a Mesa Diretora da Câmara entrou com recurso junto ao Supremo Tribunal, invocando ‘violação de preceitos constitucionais por parte dos ministros da Corte, e pedindo que a decisão dos deputados contra a ação penal do deputado Alexandre Ramagem seja mantida.