Adalberto Souza

CULTURA

As sujas esquinas de uma solidão bêbada

22/09/2014 13h01

Existe um mundo...

Existe um mundo onde putas e bêbados convivem com castiças donzelas de araque. Existe um mundo onde a piscina do puteiro foi cheia com cerveja Polar gelada, onde a poesia está em qualquer coisa.  Até naquele "bar vazio tocando Belchior" onde, olhando de lado, se descobre que "lirismo” é quando a puta chora e ninguém acode.

 

Esse mundo fica às margens do Rio Amazonas. Bem ali, na cabeça de Diego Moraes.

 

Um reino onde o lirismo impregna as esquinas escuras de um beco qualquer, para de uma frase qualquer nascer poesia. "A solidão é um deus bêbado dando ré num trator" é a tradução desse mundo poético.

 

Tudo parece certo e errado, ao mesmo tempo. As imagens se confundem em esperas, encontros, buscas, bebedeiras, é tanto sentir que o leitor já começa misturar-se e encontrar-se nos becos e vielas da leitura do Poeta. Assim meio atropelado pelas tantas formas de transitar por entre os versos do livro.

 

No reino das palavras de Diego Moraes, esqueça as sutilezas, as palavras educadas, em Diego Moraes a palavra fere... e marca.

 

Nada é dito de forma aleatória. E nada é deixado de lado. 


          Esqueça o falso moralismo. A poesia de Diego é crua, visceral e dilacerante. Certeira. É como começar a ser devorado pelos próprios olhos. Não é permitido medo nem muito menos voltar no meio do caminho.  Se o deus embriagado resolve dar ré num trator, ao leitor, não é permitido tal coisa. Depois da primeira página, o livro te arrebata até o final, aos solavancos e deslumbramentos.

 

O amor pode ser encontrado andando de ônibus, mas que não se enganem ele poderá durar apenas até acabar a vodka Natascha. Ou então virar um travesti com a cara de Charles Bronson. Tudo é possível e nada é retornável. A literatura de Diego não está aí para ser facilmente lida, ela não está ali para curar ninguém, muito pelo contrário, está ali para despertar o estranhamento a vontade de descobrir como seria ter "olhos de pomba gira e lapa de Vera Fischer". O que o poeta quer é despertar no leitor o sentido da palavra em si, descobrindo que aquele sentido é só mais um, escondido no enredo de cada verso.

 

Não existem espaços vazios no reino das palavras do poeta.  Diego Moraes é um "eterno combatente do tédio". Metralhadora de palavras, sua poética, ácida e solúvel, abrasante não permite meio termo, aliás, não existem meios termos no imagético mundo de Moraes.

 

É como se o poeta contasse uma história, um Hans Cristian Andersen, embriagado de vodka barata num soturno bar de região portuária de Manaus, escrevendo poesia, como se sua vida dependesse disso. A nós leitores, cabe apenas seguir o curso traçado pelas suas linhas, tortuosas linhas de encontros e desencontros, nas escuras esquinas de uma cidade qualquer.



Diego Moraes além de “A solidão é um Deus bêbado dando ré num trator” também publicou  “A fotografia do meu antigo amor dançando tango”, ambos pela editora Bartlebee.

 

 

http://www.bartlebee.com.br/catalogo/livro/a-solidao-e-um-deus-bebado-dando-re-num-trator

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